Harmonia é o substantivo feminino com origem do idioma grego e que indica uma “concordância” ou “consonância” tanto a nível artístico como a nível social, tanto por história da palavra quanto por significado da mesma.
Em resumo, harmonia é o resultado natural da verdade: É um conceito clássico que se relaciona às idéias de beleza, proporção e ordem.
Alguns sinônimos de harmonia (importante de se prestar atenção para se definir o que é realmente a palavra e a definição) podem ser a primeiro plano: equilíbrio, ordem, acordo, combinação, concórdia, consonância, entendimento, conciliação, conjuntura, etc. Outros, a posterior, já resumem: entendimento, acomodamento, adesão, ajuste, avença, coalizão, compromisso, consenso, consentimento, inteligência, liga… e por ai vai.
O “estado de harmonia” e o “estudo da harmonia” explicam saber se algo foi composto com qualidade, com concordância e beleza (na música também e se avalia isso). A harmonia seria a combinação de elementos sucessivos, dos quais se fixa bem aos olhos e aos movimentos… talvez beleza, realmente.
No âmbito da estética, a harmonia aponta uma característica ao que é considerado “bonito” (como já dito), indicando uma concordância entre combinações, tamanhos, movimentos, ações (se falarmos de roupas dai entrariam as cores também). Já num contexto mais filosófico, a harmonia faz parte da metafísica de “Leibniz”, que recomenda uma concordância ao que é pré-determinada. Ou seja: que foi criada por Deus desde o princípio. Se está bem: então é harmônico.
Um elemento que tem harmonia é algo que está disposto de forma equilibrada e justa entre as partes de um todo. Assim, a harmonia muitas vezes é o resultado de um sentido de paz entre pessoas ou ações entre elas, ou ainda a concordância de opiniões ou sentimentos entre tudo. Ex: “Eu sempre gostava que passar o fim de semana na casa do meu melhor amigo, porque notava uma harmonia na sua família!”. Interessante essa definição.
Certa feita, para exemplificar, perguntei há um amigo dançarino: “Se eu sair de uma distância de 10 metros de um ponto de chagada e você a 5 metros desse ponto de chegada… como os dois andariam HARMONICAMENTE até chegar ao ponto?”
Ele me disse que seria impossível. Pois a quantidade de passos seriam diferentes, o tamanho dos passos seriam diferentes, o corpo de cada um, que também é desigual, reagiriam também desigualmente a essas distâncias… só se chegassem em tempos diferentes no local de chegada.
Eu retruquei: “Mas eu preciso que seja exatamente ESSE movimento, não posso mudar ele. Tenho que harmonizar… e um NÃO PODER é algo que não aceito. Me sugere algo?”
Ele de novo me disse que seria impossível. E aí que notamos um dos problemas da nossa dança gaúcha moderna.
Ah… não direi como eu harmonizaria, pois queremos justamente que cada um pense a problemática da sua maneira – mas eu claro que acharia, e achei: mil maneiras de harmonizar.
Talvez analisar a tipologia de movimento, antes de harmoniza-lo, seja um item mais do que importante na concepção do grupo, já que na dança existem movimentações que são coreográficas e outras que são frutos da interpretação (da intenção interpretativa) .
No “Balaio” temos a coreografia e o sapateio: o sapateio é interpretativo e o passeio é mais coreográfico. Existe realmente a exagerada precisão de enrijecer a movimentação dos sapateios, visto que são de motivo interpretativo, tirando assim do dançarino a sua personalidade verdadeira e autêntica como ser humano?
Há coisas que se tem a impressão de que não fica harmônico diferente, que não deve ser diferente, etc. Assim, achamos que se poda muito a possibilidade criativa e de identidade de cada um, em si.
Um grupo que realiza ao mesmo tempo somente 1 sapateio do “Balaio” e um outro que realiza ao mesmo tempo 12 sapateios diferentes na mesma dança, por exemplo: Se tem a impressão errônea de que o que faz 12 sapateios tem menos harmonia do que um grupo que realiza 1 sapateio somente. Isso, a começo de conversa, entendemos com um conceito a ser revisto: na verdade o grupo que realiza 1 sapateio “engana” mais do que o de 12 sapateados.
Disfarça talvez uma “falta de harmonia” com 1 sapateio único. Porém o de 12, pode ser tão mais harmônico quanto… mais difícil, claro. Porém, se isso acontecer, seu nível de harmonia é “hard”, (desculpem a palavra). Mas dai me perguntam: mas como harmonizar 12 sapateios? Há várias maneiras.
E daí voltamos aos sinônimos citados ali acima. Cada grupo acharia seus equilíbrios, suas ordens, seus acordos, convenções, concórdias, consonâncias, entendimentos, conciliações, conjunturas (e, disso tudo, beleza). Tudo isso para poder ter “harmonia” em uma combinação de 12 sapateios distintos.
Há de se trabalhar e criar alternativas coerentes para tal. Já se realiza isso nas danças birivas, por exemplo: no “Chico-do-porrete”… com sucesso e rigor muito “folclórico” nas avaliações de harmonia. Um grupo que faz sapateios diferentes (como nas birivas) não pode ser desarmônico. Isso pode ser considerado um pré-conceito. Teria de ver se esse ponto de harmonia foi montado e executado certo, com qualidade… com coerência. Isso sim.
Outro fato seria o das danças espalhadas, onde no INÍCIO didático de cada dança (lá em seus “manuais”), ela diz se é de par independente, soltos, de conjunto, dependente, coreografada, ensaiada, etc... o que hoje em dia não se leva nenhum pouco em consideração justamente pela “harmonização” da mesma.
Ou seja, se muda a história da própria dança, suas intenções e, até, sua coreografia (podemos dizer assim) para justamente definir um harmonia, que nada mais é do que mal definida e mal olhada, também com pré-conceito. Um “Chico sapateado”, uma “Havaneira marcada”, um “Balão caído”, “Chotes carreirinho”, “Chotes de sete voltas” e tantas mais (todas de quarta geração coreográfica, onde são danças historicamente e coreograficamente de salão: espalhadas, de pessoas e pares independentes uns dos outro), são danças que somente foram vistas e pesquisadas dançadas livremente na sala, nunca combinando movimentos, dependendo-os.
Portanto esse é justamente o DESAFIO da mesma: dança-la solta, porém com harmonia. Desafio esse que se levam por terra abaixo ao enrijecerem e coreografarem o lado do giro dos pares, o jeito do giro dos mesmos, criando desenhos geométricos (que eram características de outra geração que não a quarta) e assim por diante. Isso não seria harmonia: seria uma “maquiagem”, uma lassidão para não achar harmonia em quem dança espalhado e independente.
A harmonia não estaria no lado do giro e nem na geografia desenhada no palco… e sim, estaria em outras coisas que nunca nenhum grupo desse parâmetro “técnico” identificou, e talvez nem tentou.
Há de se criar e se achar o “ponto de harmonia”: o “estado de harmonia” para esses movimentos. Isso pode ser feito e é feito em todas danças do mundo… e nós, ainda achamos que a “robotização” é o “estado de harmonia” mais apurado que existe, erroneamente.
Ele é um dos estados harmônicos apenas… o mais preguiçoso, talvez. Até porque é mais fácil tocar um ensaio dizendo quem está errado em uma fila de peões (ou de prendas) do que se ensinar princípios básicos de conhecimento para nosso alunato. E é, também, mais fácil avaliar um grupo “robotizado”… mas não devemos estar no meio das nossas danças justamente para procurar caminho mais fácil, do atalho.
Assim, digo: a maior observação que devemos de dar, como grupo, é, justamente, a “proposta de harmonia”. Devemos analisar a qualidade da proposta de harmonia apresentada de cada grupo. O “ponto de harmonia”… o “estado de harmonia” (de equilíbrio, ordem, de acordo, combinação, concórdia, consonância, entendimento, conciliação, conjuntura, etc e etc). Não necessariamente queremos dar a mesma ênfase harmônica do que outro instrutor ou a que os avaliadores combinaram que seria a correta.
E vale a pena o avaliador saber identificar esse “ponto de harmonia” de cada grupo e ver se ele o qualificou bem. Esse sim também seria a boa avaliação da harmonia. E desse modo de avaliação não prejudicaria os mais rígidos ou os mais soltos… nem os básicos nem os criativos. Há muitos grupos que tem uma característica “solta”, por exemplo.
E um “estado de harmonia” mais rígido, nos mesmos, o deixaria um tanto sem qualidade. E vice versa. Uma instrução que não observou o caminho da característica e personalidade de cada grupo, pode daí sim ser qualificado como “mal harmônico”, por exemplo. Ou o que observou, pode ser qualificado como “bem harmônico”. A avaliação (os jurados) e a criação (os instrutores) devem de identificar nos grupos “onde está a harmonia dele”, em que “elementos” ela esta identificada e focada. E assim por diante…
Qual a harmonia que o grupo quer e pode passar. E cada avaliador ver se ele realizou isso corretamente, transparecendo isso, criou bem isso, montou bem e/ou executou com qualidade. Pode estar essa harmonia no enrijecimento, na robotização, em movimentos ao mesmo tempo, porém não iguais, em movimentos iguais porem não ao mesmo tempo, em movimentos diferentes com batidas iguais, etc e etc (dei alguns exemplos básicos. Cada grupo teria e tem os seus modos).
Cada grupo tem sua linguagem e isso deve de ser valorizado, assim como seu entendimento e sua oportunidade de levar isso a palco. Cada grupo terá sua HARMONIA própria, vindo dos grupos para as avaliações (e não das avaliações para os grupos). Se ele executou bem, dai a nota da harmonia é valorizada… se não, nota de harmonia depreciada.
Cada grupo apresenta o seu, e o avaliador vê se tá bem feito! Se tá bem feito, tá harmônico! Se não for bem feito não está! Basicamente. Cada grupo dá o ponto e se avalia a qualidade apresentada, a evolução. Não quero dizer que uma visão de harmonia apenas está errada, mas existem outras (das quais os grupos não podem trabalhar), das quais devemos levar as propostas novas para ampliar até a diferença entre cada grupo e poder evoluir em termos de criatividade.
Os concursos não são de “mais harmônico” e “menos harmônico”… e sim de melhor grupo. Assim, a harmonia deve também de ser avaliada entre: “harmônica” ou “não harmônica”. A relação de avaliação deve de ser do grupo para com a dança, não do grupo para com outros grupos (inclusive, porque, não se sorteia ou se escolhem, todos os grupos, as mesmas danças com as mesmas características e estilos para uma apresentação normal).
Hoje se tem essa mania de “qual o grupo mais harmônico”… “qual o grupo mais cerimonioso”… “qual o grupo que mais sapateia”… “qual o grupo que mais sarandeia”… “qual o grupo que mais seduz”… “qual o grupo mais alegre numa contradança”… etc e etc. É um mais do mais… sem saber onde o “mais” vai parar. A avaliação deve de ser entre “está” ou “não está”: está harmônico ou não está harmônico? Está cerimonioso ou não está? Está alegre ou não está? Esta sapateado ou não está? E o somatório de elementos “feitos” e/ou “feitos com qualidade” é que darão (ou eram pra dar) o prêmio de um evento e concurso.
Não um “mais ou menos”! Por isso hoje temos “mil especialistas” em tudo, em relação às danças… e “mil e um tercerizados” pra podermos ter um grupo de qualidade hoje em um concurso. As avaliações e as visões estão viciadas e desvirtuadas, ao longo do “apertar dos parafusos”. É extremamente difícil cultuar as nossas tradições com a dança nativa do Rio Grande do Sul, hoje em dia!
A harmonia tem segurado muito a própria interpretação artística, por não permitir que cada dançarino consiga ser ele mesmo em palco. E há grupo, inclusive, que as vezes não consegue ser ele mesmo em cena, tendo que se restringir por uma combinação rígida de harmonização.
A questão até não esta tanto nos grupos, mas sim numa visão de harmonia que é a mesma desde 1986, dos primeiros FEGARTs, que há de se melhorar e mudar isso. Os grupos não crescem na interpretação porque estão presos às vezes presos a uma combinação harmônica “quadrada”. A própria escolha das danças no ENART, hoje, 33 anos depois do I FEGART, ainda é balisada pela Harmonia: roda, fila, espalhada. Isto sendo que a harmonia “vale” 2,0 pontos na planilha, menos que Correção 3,0 e metade que Interpretação (4,0). Ou seja: vale menos, mas é o que manda ainda numa apresentação e num concurso, a nível estadual.
Ilógico!
Há de se modernizar urgente essa visão, um tanto já ultrapassada. Inclusive, comparado com os estudos tão aprofundados em termos interpretativos, que as equipes tendem a fazer sobre o quesito.
Ser igual não necessariamente é ser harmônico.
Ser diferente também pode ser harmônico.
Rigidez pode ser um ponto de harmonia, mas existem milhares de pontos (estados) de harmonia a se explorar, se criar e valorizar… com qualidade.
Vamos evoluir e amadurecer esse ponto, justamente para os grupos e as apresentações crescerem juntas também!
(Obs.: Sugiro o livro Danças tradicionais e a Carta de Vacaria – livro que esclarece e muito critérios de avaliações, sugeridas pelo próprio João Carlos Paixão Côrtes, e pouco se usa e se leva em consideração).
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