Maior nome da cultura gaúcha faleceu hoje, na cidade de Porto Alegre!
Com imensa tristeza comunicamos que o grande Mestre Paixão Côrtes faleceu hoje, após complicações em cirurgia ortopédica na perna.
O Rio Grande chora, pois o Seu Paixão faz parte de todas as famílias que mesmo da forma mais singela, cultuam o tradicionalismo gaúcho.
Contamos abaixo um pouco de sua história e trajetória, através das informações retiradas dos seus próprios livros, alguns deles escritos com o também já falecido, Barbosa Lessa.
Quem foi Paixão Côrtes?
João Carlos D’Ávida Paixão Côrtes é engenheiro agrônomo, formado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Especializou-se na área de zootecnia, em ovinocultura.
Introdutor de avançadas técnicas no setor de produção ovina e autor de obras sobre sua especialidade profissional, ganhou também reconhecimento como um dos mais importantes e respeitados folcloristas do Rio Grande do Sul, com projeção internacional, por suas pesquisas, cursos e publicações.
Paixão Côrtes nasceu em 12 de Julho de 1927, em Santana do Livramento.
Ainda jovem, encontrou no basquete seu vigor físico, como atleta em clubes sociais em que disputou campeonatos nas cidades nas quais atuou.
Quando estudava em Porto Alegre, em 1947, protagonizou um momento marcante da história cultural rio-grandense. Ao lado de mais sete jovens, estudantes e outros, formou o “Grupo dos 8”, e, equestremente, o Piquete da tradição
Ele iniciou muito cedo cruzando o Rio Grande com suas pesquisas folclóricas. Àquela época, e no transcorrer do tempo, se viu obrigado a comprar sua aparelhagem própria (gravadores, filmadora, máquinas fotográficas, projetores, etc…) para “vivenciar” a cultura popular junto ao autóctone homem do campo por perdidos rincões.
Esteve oito vezes na Europa divulgando artisticamente cantos, sapateios, bailados e entrajares gaúchos.
Mereceu a solene missão de dar boas vindas ao então Papa João Paulo II, oferecendo a Sua Santidade uma cuia de chimarrão como símbolo da hospitalidade da gente gaúcha.
É figura pioneira de comerciais televisionados da primitiva TV Piratini, através de imagens gauchescas “ao vivo”, com criações de expressões folclóricas.
A obra de Paixão Côrtes forjou a alma e identidade da gente gaúcha. Ele é considerado uma figura além de seu tempo, um ícone, uma lenda viva do Rio Grande do Sul.
Um dos seus maiores legados com certeza foi a reconstituição de diversas Danças Tradicionais Gaúchas que estavam perdidas, onde iniciou um árdua jornada junto ao seu amigo Barbosa Lessa. Hoje são mais de 100 temas bailáveis, além de centenas de obras publicadas sobre os mais diversos aspecto do canto, dança e entrajar do gaúcho sul-riograndense.
FRASES PAIXÃO CÔRTES :
“(…) você bate no peito e diz “Eu sou gaúcho”, porque você conhece suas origens. É diferente com pessoas que não tem essas heranças. Não podem bater no peito e dizer “sou gaúcho”. Não, você é rio-grandense. Nasceu no Rio Grande do Sul. Gaúcho é um estado de espírito, não é um nascer, é querer ser!”
“O movimento tradicionalista vai se modificando no transcorrer do tempo, não regride, se atualiza com o conhecimento da época. Com isso ele não fica preso ao passado, ele cultua o passado e avança!”
“Podemos viver um momento tradicionalista de calção ou de smooking; tradicionalismo não se manifesta exclusivamente na forma de ser, mas principalmente na de sentir, de viver.”
“As ideias separatistas de hoje não passam de momentos, uma nuvem que passa para pessoas que não estão integradas ou que não se propõem a se integrar e que não trazem contribuição para a solução dos problemas, ficando num diletantismo político, estéril, diante de uma realidade que exige consciência de suas raízes e atitudes dignas para o desenvolvimento do Estado, do município, da sociedade. Não é apelnado para o passado que vamos justificar a necessidade de ser diferentes dos outros.”
“Acredito que um Centro de Tradições tem diversas finalidades e cada um deles dá as dimensões dentro do nível cultural de seus dirigentes. Então, numa hora ele está muito bem, noutra hora não está tão atuante, como qualquer sociedade.”
“O que penso é que os Centro de Tradições, de um modo geral, nos dias atuais, se tornaram simplesmente, sociedades recreativas com finalidade de música, dança e rodeios. Um número limitado está cumprindo os objetivos para os quais nós nos propusemos quando criamos o 35.”
“Raros são os Centros de Tradições que tem biblioteca, museu, proporcionam programas culturais ou cursos sobre folclore e tradição. No entanto, “fandango” ocorrem no mínimo um mensal, afora às reuniões sociais semanais… Em muitos CTGs nossas tradições estão concentradas quase exclusivamente na “Semana Farroupilha” e em “Rodeios”. O resto do ano é farrancho, carne, mate e… Constroem-se enormes sedes sociais sem vínculo com a arquitetura da terra ou não inspirada em motivo gauchesco. O importante é que a churrasqueia seja enorme e a copa tenha capacidade para grande estocagem de bebidas.”
“Nós temos que reconhecer que antes da fundação dos Centros de Tradição quase nada existia. Foi uma tremenda abertura para revitalizar a cultura popular. No fundo, nem todos estão preocupados com isso. O problema começa com qa deficiência da nossa cultura nacional.”
“O tradicionalismo é um estado de alma e de espírito. É uma forma de rever as coisas do passado na preocupação de retirar elementos fundamentais que possam ser utilizados para consolidar o indivíduo na sociedade atual.”
“Tradição não é voltar ao passado, mas cultuar o passado.”
“Não é preciso bancar o grosso ou parecer ignorante para justificar autenticidade.”
“O Rio Grande do Sul é, atualmente, um dos Estados mais pobres em folclore. (…) Vive-se, agora, da projeção ou reinterpretação do folclore.”
“Assim, chegamos à principal característica das danças gaúchas: a teatralidade do campeiro. Dentro do máximo respeito, ele procura realçar sua individualidade – desde o modo de se vestir até o modo de executar a coreografia – resistindo a ideia de cair na vala comum da mesmice coletiva. Ele procura sobressair, mostrar que é o melhor sapateador, procura recitar os versos mais pitorescos e enfeitar seus passo com variações as mais difíceis.”
“Dance com a cabeça e não somente com os pés. A mente é que comanda as manifestações físicas do nosso ser. A medicina conceitua “morte cerebral” como “morte da vida”. Não seja um dançarino “morto” e não faça do dançar, uma manifestação sem vida”.
“A interpretação destaca a personalidade do bailarino e projeta sua postura na dança. Descubra a mensagem que a dança traduz e entregue-lhe a pujança de se coração. Se não, você verá um eterno dançante vazio, como tripa de linguiça, ao vento…”
“Convém lembrar que dançar, não significa somente estabelecer adequado e correto número de passos aos compassos da música ou sua equivalência. É necessário interpretar os movimentos, concernentes ao ritmo e ao andamento musical e peculiaridades do tema, dando-lhes alma, vida própria à descrição formal do motivo, descobrindo-lhe o espírito do bailar e a mensagem de suas expressões corporais, segundo as quatro Gerações e seus Hibridismos, identificadas nos bailares rio-grandenses, através dos critérios de nossa classificação.”
Esta é apenas uma singela homenagem, com alguns pensamentos e frases do folclorista. Mesmo falando bastante, ainda há MUITO o que ser escrito, e com certeza continuaremos a fazer.
Deus conforte a família Côrtes,
E aos que ficam, muita consciência para seguir com sua obra…